terça-feira, 25 de abril de 2017
Vísceras
Olho pra esse mar de flores desenhados no acolchoado que forra a cama que achei que dividiria contigo mais vezes do que pude e me perco. Já te contei como gosto das cores que as compõe?
Se há algo que eu gostaria de me desculpa hoje, apenas por hoje, é por ter tirado tua escova de dentes da pia do banheiro. Eu não a joguei no lixo como há um mês atrás, eu guardei na gavetinha, porque eu não podia mais deixá-la ali. Dessa vez, eu juro, não é pela esperança arraigada de que você volte, não, não precisa voltar dessa vez, mas eu só não quero jogar nada fora. Eu não posso fazer isso comigo.
Nada tem me feito chorar, tudo tem passado rápido demais a minha volta, acho que porque tenho passado muito tempo nos transportes público e pelas janelas o mundo realmente voa. Acho que era isso que eu precisava: voar! Ainda que apenas pelas janelas medíocres de um automóvel.
Eu sinto medo desse medo que não estou sentindo. Nada, baby, nada tem me arrastado pra lugar nenhum, nem pra saudade, nem pro desprezo. Me sinto ausente de nós e isso não é nenhum pouco confortável.
Eu sei que você teria ficado mais um pouco se eu tivesse insistido, mas de que adiantaria? Eu não aguentaria insistir mais uma vez pra que você me levasse contigo. Porque acho que o que pouco conseguimos entender é que eu não quis te pedir, de todo, pra que você ficasse, mas pra que me chamasse pra ir contigo, pra qualquer lugar.
Eu não aguentaria pressionar teus dedos mais uma vez para que não soltasse, pouco a pouco, minha mão. Isso diz muito sobre nós.
Ainda não posso olhar nos teus olhos, e a certeza disso é como trair a mim mesma, logo eu, que desejei teus olhos todas as vezes mesmo que para te ver fugindo de mim pra dentro do teu universo profundo e distante.
E de tudo que me sobra nessa madrugada que já levou embora o dia 25, eu só gostaria de ficar com a certeza, ou ao menos com a sensação de que te fiz mais feliz do que qualquer coisa que seja contrária a felicidade. Mas não, meu bem, eu sinto exatamente o contrário, eu devastei aquilo que era pra ser no seu tempo te afogando, ainda que na tentativa angustiante de te salvar.
quarta-feira, 19 de abril de 2017
Tempos
Por algum tempo ainda pensaremos nos nossos tempos: 15 horas você vai, volta umas 19, às vezes não volta. Eu vou umas 14, fico meio aqui meio lá.
Agora, 22:30 é meu alívio imediato, cravado no relógio do ponto!
Tem outros tempos também: minha hora de dormir, quase 3:00 am. Você sempre dorme primeiro. Eu sempre acordo primeiro.
Depois o relógio vai mudando seu curso, vai parecer correr de trás pra frente, e outros tempos virão.
Só que tem tempo que finca na alma: 4 de junho, já passava da meia noite, 6 de junho, foi a tarde de chuva que me perdi no tempo e nos teus olhos, 25 de outubro, demos nome ao amor que latejava.
19 de abril, 19:19, uma flor murchando no peito, dois amuletos de proteção, e uma memória indissolúvel.
(Vai ser no gerúndio enquanto estiver indo)
Rosa
Eu vi uma menininha no ônibus
Os olhos dela eram castanhos
Daqueles bem claros e profundos
Acho que eu fui essa menina um dia
O céu estava azul turquesa
Nada tirava seu olhar daquele azul
Acho que já fui esse olhar livre
Tudo passou rápido pela janela
Menos aquela imensidão azul
Abril se abre calmo pro outono
E nessa calma de chá de hortelã
Vou abrir meu coração pra garotinha
Minha pequena, pra por no colo.
À ela, de sobrenome Rosa.
segunda-feira, 17 de abril de 2017
A neblina
Eu lembro quando ainda era complicado, pra dizer no mínimo, puxar seu olhar pro meu, você sempre fugia. Eu nunca soube exatamente porque mas eu precisava que você entrasse por essa porta e sentisse a tempestade que mora dentro de mim.
Lembrar dessa fuga, dessa sensação, é a única coisa que me emociona hoje. É que hoje o silêncio me pertence, e eu o dominei com as unhas, ele não me assusta.
Eu lembro de você indo embora, me deixando aos pedaços por tantos lugares, e eu fui ficando fragmentada, em prantos, sentada em pisos frios, no chão de um bar, numa praça descuidada, no trânsito da metrópole, numa cadeira dobrável sempre segurando o choro, o grito, o caos. E quantas vezes, ao me querer de volta, ao me amar de novo, você me pediu: "não segura o choro, meu bem".
Realmente, eu não sei não segurar o choro, e tudo vai inchando, calando, minguando, até escoar em sangue.
E você me pede pra me deixar cair em teus braços, que é pra eu deixar você me cuidar, mas você deixou meus pedaços por aí e nunca voltou pra buscar. Você se surpreenderia com o quão menos eu falo hoje, e ontem me arrancou o fôlego quando abri a janela e vi a neblina tomando conta de tudo a minha vista, aquilo era silencioso, não esse silêncio que quase explode teu peito, não esse vazio tão cheio de retidão comprimindo a imensidão das palavras, calando o caos em busca de paz. O orvalho nas folhas das plantas, os vidros escorrendo em gotas, os feixes de luzes amarelos dos postes da minha rua, o breu, aquilo sim era vazio. E eu saí na sacada, era tudo neblina, nada se via, apenas vultos, era lindo e calmo. Arrisco dizer que o medo te tomaria pelos pés, e meus pés foram levados para o chão frio e úmido, umedeceu tudo por fora, secou tudo por dentro. Depois de um cigarro que queimou rápido demais eu deixei o olhar vagando por aí, sem esperar mais nada. O universo é esse vasto caos em sincronicidade, porque eu seria diferente?
A saudade, ainda latente, não é mais minha maior companhia, e sim as respostas pras perguntas que eu nunca fiz.
Não cabe mais em mim espaço pra despedidas.
domingo, 16 de abril de 2017
Constelações de poeira
Que enquanto você trazia a tona por meus olhos aquelas águas salgadas eu deitava minha cabeça no colo da mãe de águas doce.