segunda-feira, 17 de abril de 2017

A neblina

Eu lembro quando ainda era complicado, pra dizer no mínimo, puxar seu olhar pro meu, você sempre fugia. Eu nunca soube exatamente porque mas eu precisava que você entrasse por essa porta e sentisse a tempestade que mora dentro de mim.
Lembrar dessa fuga, dessa sensação, é a única coisa que me emociona hoje. É que hoje o silêncio me pertence, e eu o dominei com as unhas, ele não me assusta.
Eu lembro de você indo embora, me deixando aos pedaços por tantos lugares, e eu fui ficando fragmentada,  em prantos, sentada em pisos frios, no chão de um bar, numa praça descuidada, no trânsito da metrópole, numa cadeira dobrável sempre segurando o choro, o grito, o caos. E quantas vezes, ao me querer de volta, ao me amar de novo, você me pediu: "não segura o choro, meu bem".
Realmente, eu não sei não segurar o choro, e tudo vai inchando, calando, minguando, até escoar em sangue.
E você me pede pra me deixar cair em teus braços, que é pra eu deixar você me cuidar, mas você deixou meus pedaços por aí e nunca voltou pra buscar. Você se surpreenderia com o quão menos eu falo hoje, e ontem me arrancou o fôlego quando abri a janela e vi a neblina tomando conta de tudo a minha vista, aquilo era silencioso, não esse silêncio que quase explode teu peito, não esse vazio tão cheio de retidão comprimindo a imensidão das palavras, calando o caos em busca de paz. O orvalho nas folhas das plantas, os vidros escorrendo em gotas, os feixes de luzes amarelos dos postes da minha rua, o breu, aquilo sim era vazio. E eu saí na sacada, era tudo neblina, nada se via, apenas vultos, era lindo e calmo. Arrisco dizer que o medo te tomaria pelos pés, e meus pés foram levados para o chão frio e úmido, umedeceu tudo por fora, secou tudo por dentro. Depois de um cigarro que queimou rápido demais eu deixei o olhar vagando por aí, sem esperar mais nada. O universo é esse vasto caos em sincronicidade, porque eu seria diferente?
A saudade, ainda latente, não é mais minha maior companhia, e sim as respostas pras perguntas que eu nunca fiz.
Não cabe mais em mim espaço pra despedidas.

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