quinta-feira, 9 de março de 2017

Travessia

Ouvi a campainha tocando, ninguém nunca vem aqui, pensei que pudesse ser você num impulso quase utópico de pedir pra voltar pra casa. Não era, era um ninguém que nunca vem e veio.
Tenho acordado mais cedo do que eu gostaria, de repente meu corpo desperta e eu peço a ele pra que fiquemos, não precisamos acordar agora. Hoje a lágrima escorreu no travesseiro antes mesmo que eu pudesse abrir os olhos direito. Sabe, é difícil demais te ver indo embora pela terceira vez, e o que mais dói é que nenhuma das vezes você realmente foi, eu te vi indo, indo, não te perdi no horizonte antes que você decidisse voltar, mal sabe você o quanto foi, por longo tempo, um desastre olhar pro horizonte. Dessa vez eu estava quase me reconectando com ele, entendendo que você não estava mais no limbo do quase real, que havia acabado, ou que poderia acabar, aquela sensação fantasmagórica. Você estava ali, do meu lado, ainda que com todas as nossas dificuldades, nossos vícios comportamentais, nossas insanidades, ainda assim estávamos decididas a manter as mãos dadas. Eu preciso te dizer isso! Eu preciso muito aparecer no portão da sua casa! Eu preciso muito te ligar até que você atenda e ouça minha voz! Eu preciso sentar na calçada da sua rua e esperar você chegar, sabe-se lá de onde e te levantar num abraço comovente! Eu preciso sussurrar ao pé do teu ouvido que eu amo você, eu amo muito você! Mas eu não posso e isso basta pra que tudo escorra ralo abaixo com a água do chuveiro. Não demorou pra que você acreditasse que há algo de errado em estarmos juntas, e não é tão importante assim o tudo incalculável que as pessoas falem, essas tantas que nunca estiveram no íntimo da nossa dor, o que importa é o que você faz com isso. O que você fez com tudo isso, meu bem?
O que você fez com todas as vezes que os impulsos auto destrutivos foram validados enquanto correr pros braços que te acolhem, te envolvendo em calor de carinho, te parece tão imprudente?
Talvez porque não seja seu esse canto agora, talvez porque perder seja o que você consegue ganhar pra si agora. 

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