Você olhava pra mim com um olhar investigativo enquanto eu admirava a fumaça saindo da brasa do cigarro recém acendido. Eu pensava na beleza do que não é palpável, do que passa por nossos olhos e não fica. Eu pensava em nós.
No que você pensava?
Eu sempre tentei incansavelmente entender o que seus olhos me diziam, até que te ensinei a escrever com os dedos, na pele, no ar. Eu ainda o faço quando quero que minha palavras se desfaçam como a fumaça do cigarro.
Dentro do meu peito efusivo eu pedi um milhão de vezes pra que você ficasse, será que você não ouviu? Cada batida acelerada do meu coração era lembrança da saudade que ainda está por vir, e virá, eu sei: chutando a porta, arrancando os meus pelos, que cabelos já não tenho.
Mas depois é só acalmar a saudade num abraço firme, daqueles que minha mãe me dava depois de um surto de raiva na infância. Talvez eu vá precisar de um tempo pra concertar a porta, e aí sentar no chão com uma xícara de café e um cigarro entre os dedos. Quem sabe quando eu realmente conseguir te dizer adeus eu também não deixe de fumar.
Hoje acordei e o céu estava cinza, mas não fazia tanto frio assim, era só a coloração acinzentada cobrindo todo o horizonte: as cores cinzas também podem amornar o coração, obviamente que o café fresco ajuda nessa empreitada.
Você olhava pra mim num misto de compaixão e pedido de socorro, e eu olhava pra você num pedido contraditório de que desatemos o nó já que não conseguimos ficar com o laço.
E quando eu me distraí eu me apaixonei de novo por você, eu me peguei deitada no teu colo, no parte alta do half, longe de toda aquela gente que cantava, dançava e se mexia de forma estapafúrdia. E que me perdoe a poetisa portuguesa mas eu me apeguei a essa palavra: estapafúrdia.
Você me acariciou o corpo e a alma e eu te disse, não sei se ouviu, mas eu disse: ''Você me acalma tanto, é como se fosse outro mundo.''
Você não disse nada, só me envolveu eu seus pequenos braços com mais força e eu entendi que você sabia do que eu estava falando.
Eu matei o pé de hortelã, eu matei o tomilho e o manjericão, e há quem diga que eu só os deixei morrer. Eu quero deixar morrer a morada que você fez dentro de mim. E que se apague como se apaga um cigarro no asfalto. É que eu nunca jogo meu cigarro aceso, eu o apago até que a última faísca brilhante vire pó.
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